10.7.06

Caterpillar

Quebrou-se a cápsula, derramou-se o veneno. O líquido vil já percorre o corpo, atravessa os tecidos, interrompe o normal funcionamento das células para deixar a sua larva de tristeza. E, em vez de o veneno se anular no antídoto da razão, vai alimentando o corpo estranho que, pequeno no seu casulo, ainda sem ser corpo nem ser estranho, engorda ao transformar-se no outro.
Deixou o casulo vazio, cordão umbilical cortado, ganhou asas, ganhará fronteiras. E eu sei que isso não é um fim, é um nascimento, dois corpos ganham vida autónoma, podem largar e voltar a tocar-se, que a pele fronteira que separa é a pele ponto de contacto que une. Queria deixar-te ir. Mas a minha mão não me obedece. Contrai-se pelo veneno, fecha-se numa rigidez dolorosa. Não és tu, sou eu, este é o meu corpo e o meu veneno, derramado em mim. Sempre foi assim. E eu não sei ser de outra forma.